sábado, 23 de julho de 2011

História singela para um tema difícil (Estadão - 04/05/2011)

http://bloggeracaoeditorial.com/2011/05/04/no-estadao-historia-singela-para-um-tema-dificil/

Segredo Segredíssimo (SPZINHO - 03/03/2011)

O assunto é espinhudo: não é que ninguém quer falar, é que ninguém quer nem PENSAR.

Mas abuso sexual infantil existe, no Brasil, e em todas as classes sociais. E, ao contrário do estereótipo do estranho abusador, a realidade é que esta pessoa é geralmente muito próxima da criança. Odivia Barros, autora de Segredo Segredíssimo, sabe bem disso, afinal ela sofreu na própria pele.

E com o objetivo de abordar o tema com a própria filha, e conscientizar pais, crianças e adolescentes, ela escreveu o livro, provavelmente único hoje no Brasil.

Segredo Segredíssimo é uma obra que fala do problema de pedofilia e abuso sexual na linguagem das crianças, usando imagens e situações cotidianas do mundo delas.

O conto protagonizado pela menina Alice, que toma conhecimento do “segredo segredíssimo” de sua amiguinha Adriana, traz elementos muito próximos a uma situação real de abuso sexual, e ensina alguns passos básicos na prevenção do problema, tais como reconhecer uma situação indesejada e contar para pessoas de confiança, ou seja: não guardar o segredo.

Além disso, a mensagem, transmitida pela história, de que a criança, no caso, a pequena Adriana, será apoiada e protegida após contar o segredo a seus familiares, e não recriminada ou punida, é de extrema importância para conscientizar os leitores mirins da necessidade de romper o muro do silêncio que ainda envolve o assunto.

Sem falar que psicólogos e educadores concordam que histórias com final feliz, em que o bem vence o mal, são importantes para a formação da personalidade da criança, dotando-a de ânimo e capacidade para superar obstáculos e dificuldades no futuro.

Não li o livro, mas saiu neste domingo no Estadão, super bem elogiado.

Toc, toc, toc, que jamais aconteça nas nossas famílias, mas educar e informar é a melhor maneira de prevenir!

A única coisa que não consegui descobrir: recomendado a partir de que idade? Se alguém ler e tiver um palpite, por favor volte e conte para a gente!

À venda nas melhores livrarias

Como falar sobre um tema tão delicado com as crianças? (Gazeta do Povo - 27/04/2011)

Falar de temas como o abuso sexual é um desafio mesmo para os educadores mais experientes. 
Para tratar do problema em uma linguagem próxima ao cotidiano das crianças, Odívia Barros escreveu o conto Segredo Segre­dís­­simo (Ge­­ração Editorial, 32 páginas, R$ 22). 
Segun­do a autora, o que a motivou foi a possibilidade real de dar à criança a chance de reconhecer e evitar a situação de abuso se­xual e mostrar soluções para ela. 
O livro conta a história de Alice, que ouve o “segredo segredíssi­mo” da amiguinha Adriana: o tio queria fazer “brincadeira de adulto” com ela. Muito esperta, Alice orienta a amiga a contar o segredo para a mãe. O livro passa para a criança a mensagem de que, se contar o segredo para os familiares, será apoiada e protegida.

On-line
Tem algum tema que você gostaria de ver no próximo Educação & Ensino? Envie sua sugestão para educacao@gazetadopovo.com.br

Livre sur la pédophilie destine aux enfants (La Bouche de Monde - 22/04/2011)

Adriana est une jeune fille triste qui a un lourd secret. Heureusement pour elle, sa copine Alice est très intelligente, elle arrive à découvrir le secret d'Adriana. Elle lui donne des supers conseils. Adriana écoute son amie, elle suit ses conseils et peu à peu sa vie s'améliore...

Ce livre controversé est révolutionnaire pour les enfants, selon une évaluation faite par les enseignants. L'auteur aborde tout en douceur -mais fermement - la question des abus sexuels que peuvent subir les enfants. Ce livre est destiné à l'éducation de la petite enfance, dans les écoles.

Publié par Geração Editorial, "Secreto Segredíssimo" est une publication pionnière au Brésil. La controverse provoquée par la question des causes du genre est rare dans le monde entier.

L'auteur, Odivia Barros, combine le récit classique d'un livre pour enfants, avec la gravité que la question exige. Superbement illustré par Thaïs de Linhares, collabaratrice et ilustratrice de La Bouche du Monde (voir BduM #8, #9)  ce livre éducatif pour enfants est a mettre à disposition de toutes les écoles. Entre autres publications brésiliennes, nous devons également à ce même auteur, le livre pour enfants "Vovó Dragão", de la maison d'édition Nova Frontreira.

Source :  Folha.com

Entrevista ODÍVIA BARROS: SEGREDO SEGREDÍSSIMO, livro infantil sobre pedofilia (Casé Fortes - Todos Contra a Pedofilia - 21/04/2011)

1 - Por que escrever um livro sobre abuso para crianças? Você acha que há pouca informação sobre isso entre elas?

Na verdade, o livro SEGREDO SEGREDÍSSIMO é sobre como evitar ou sair de uma situação de abuso. Eu sofri abuso sexual na infância e tinha uma grande preocupação em proteger a minha filha para que ela não passasse por isso. A única certeza que eu tinha é que precisava orientar e ensinar para ela como evitar uma situação de abuso. Mas como falar de um assunto tão difícil com uma criança de apenas 5 anos? E será que ela iria entender o que eu estava tentando ensinar? Como eu iria saber se ela havia entendido a mensagem? E que mensagem era essa? O que eu poderia dizer a minha filha tão pequena e que a ajudasse caso ela vivenciasse uma abordagem de um abusador? Todas essas dúvidas e perguntas me angustiavam e, como gosto muito de Psicologia, comecei a estudar o papel dos contos, das histórias e dos mitos. Foi assim que aprendi que as histórias são bálsamos medicinais. Elas revelam sábias instruções a respeito da vida. E as histórias têm uma força incrível! Não é preciso ter nada, ser isso ou aquilo, basta prestar atenção.

Num conto de fadas, por exemplo, os processos interiores são exteriorizados e se tornam mais compreensíveis pela forma como são representados pelas personagens e acontecimentos da história. É por isso que, na medicina tradicional hindu, um conto de fadas que desse forma a um problema particular era oferecido à pessoa desorientada psiquicamente para que ela meditasse sobre o conto. Esperava-se que, ao meditar sobre o conto, a pessoa fosse levada a visualizar tanto a natureza do impasse que a atormentava quanto a possibilidade de resolução. Foi aí que tive a idéia de escrever um livro que orientasse a criança a evitar ou sair de uma situação de abuso.

Os contos e histórias revelam sábias lições a respeito da vida. “Os Três Porquinhos”, por exemplo, ensinam à criança pequenina que não devemos ser preguiçosos e viver “na maresia”. Ao contrário: com planejamento e trabalho duro seremos vitoriosos e podemos até derrotar o terrível lobo! “Os Três Porquinhos” ensina que há vantagens em amadurecer, já que o terceiro porquinho é maior, mais velho e também mais sábio.

Infelizmente, as crianças têm pouquíssimo acesso a esse conhecimento atualmente. A maioria das crianças de hoje conhece os contos de fadas apenas em versões enfeitadas e simplificadas de filmes ou programas de TV, e que diminuem muito o seu sentido e roubam o seu significado mais profundo. Por isso fico triste quando entro numa livraria e vejo aquela quantidade imensa de livros infantis em que as páginas viram casas e animais e tantas outras coisas. São bonitos, coloridos, engraçados, engenhosos, mas deixam muito a desejar no conteúdo.


2 - Gostaria que você contasse mais da sua experiência, que parece ter sido o grande incentivo para o livro. Como aconteceu? Foi um membro da sua família? Por quanto tempo? Que idade você tinha? O que sentia em relação ao abuso e ao abusador? Ele te fazia sentir culpa? Como conseguiu se livrar? Pediu ajuda? A quem?

Sem dúvida o fato de ter vivenciado uma situação de abuso contribuiu significativamente para que eu desejasse escrever um livro que orientasse as crianças sobre como evitar ou sair desse tipo de situação.

Comigo aconteceu exatamente como acontece em 90% dos casos: envolvendo familiares. Quando eu li essa estatística achei que só podia estar errada. 90% dos casos acontece dentro da própria família. Saí ligando para um monte de gente que trabalha com esse assunto e, infelizmente, essa é a nossa triste realidade. E não é apenas uma realidade brasileira não. Li em algum lugar que, na Europa, esse índice fica entre 70% e 85%. Em ambos os casos, os números são muito preocupantes e devem nos fazer pensar sobre o assunto. O que cada de nós pode fazer para mudar esse quadro?

Infelizmente, não tive uma orientação adequada sobre o assunto. Meus pais sempre foram muito cuidadosos comigo e me ensinaram o que nós, adultos, costumamos ensinar aos nossos filhos: não falar com estranhos, por exemplo. Mas como podemos esperar que uma criança se defenda de algo que fingimos não existir? Como uma criança pequena pode imaginar que uma pessoa da família ou um amigo que freqüenta a sua casa vai fazer mal a ela? É responsabilidade dos adultos proteger as crianças. É responsabilidade dos adultos mostra que o perigo existe e que é possível se defender revelando o ocorrido. E quanto mais cedo a criança reconhece e revela o perigo, mais tempo temos de agir e impedir que ela passe por uma situação que vai marcá-la pelo resto da vida.


3 - No livro, você faz isso muito bem. Mas, de uma forma geral, como os pais devem fazer para alertar seus filhos sobre esse perigo sem assustar ou criar uma paranoia nas crianças?

Eu tinha muita preocupação em não assustar a minha filha com esse assunto. Queria alertar e proteger sem assustar. Também não queria que ela ficasse com medo dos adultos em geral e dos parentes e amigos em particular. Por isso acredito que a literatura adequada é uma grande arma. Quando ouvimos uma história de certa forma vivenciamos a experiência. Sofremos quando a heroína se defronta com os perigos e ficamos felizes quando ela consegue achar uma saída. Para a criança, será apenas mais uma história entre tantas que elas conhecem. Mas se algum dia elas precisarem, já terão o conhecimento necessário para evitar ou sair de uma situação de abuso. É claro que o fato da criança ter esse conhecimento não garante que ela vá usá-lo. Mas é preciso que, pelo menos, elas tenham a chance de poder usar esse conhecimento, esses passos básicos que os estudiosos do tema afirmam que a criança deve cumprir para evitar ou sair de uma situação de abuso.

4 - Fale mais sobre esses 4 passos básicos que você indica. Como ensinar isso às crianças?

Na verdade o livro SEGREDO SEGREDÍSSIMO já mostra, em forma de conto, como uma criança pode sair de uma situação de abuso, ou seja, traz os passos básicos que uma criança deve cumprir para evitar ou sair de uma situação de abuso. São estes: 1°)  reconhecer a aproximação inapropriada do adulto; 2°) resistir a induções, ou seja, dizer “não”; 3°) reagir rapidamente para deixar a situação; e 4°) contar para alguém sobre o ocorrido. Tudo isso é apresentado de uma forma lúdica, tranqüila e adequada para o mundo infantil.

O livro tem tido uma ótima recepção e é recomendado por educadores. Psicólogos e psicopedagogos me falam que já estão usando no dia-a-dia da clínica. Eu fico muito feliz por isso.

5 - Pelas pesquisas e pela sua própria experiência, por que é tão difícil pedir ajuda, contar, denunciar o abuso?

Acredito que, como ninguém avisa à criança que isso pode acontecer, ela não se sente à vontade para compartilhar o ocorrido com um adulto. No livro eu mostro, pela reação da mãe da personagem abusada, que a criança deve ser acolhida e acalentada ao revelar o segredo, e não repreendida. Então se a criança aprende que será compreendida e confortada, ela se sente mais à vontade para relatar qualquer tentativa de abuso. Do jeito que fazemos até agora, sem falar sobre esse tema com a criança, ela fica ainda mais temerosa por não saber qual será a nossa reação. E isso dificulta ainda mais a questão e aumenta o sofrimento da criança. O medo mais profundo da criança é o de ser considerada indesejável, é o medo da destruição dos relacionamentos que são importantes para ela e às vezes é até mesmo o medo da violência física, se ela revelar o segredo. A criança não revela o segredo por medo da perda do amor, da perda da consideração, do carinho. E o abusador as encoraja a acreditar que o segredo não deve jamais ser revelado. Além do mais, a criança é levada a acreditar que, se o revelar, todas as pessoas decentes irão brigar com elas e abandoná-las.

Por tudo isso é muito importante que as crianças saibam, desde cedo, que serão protegidas e não repreendidas ou condenadas.

6 - Outro ponto importante é que o perfil dos abusadores é mais "normal" do que tendemos a achar, né? Há como identificar um possível abusador e evitar seu contato com crianças?

Esse assunto é repleto de uma mistificação absurda que só favorece aos abusadores. Fala-se que o pedófilo fez isso, fez aquilo. E isso faz parecer que o pedófilo é um ser à parte, é uma categoria fechada. Falta dizer que eles geralmente têm família, amigos, trabalho, enfim, são o que comumente chamamos de uma pessoa “normal”. Esses pedófilos que têm atração por crianças unicamente eu tomo conhecimento por notícias na Internet, na TV, etc. Mas na realidade do dia-a-dia as pessoas que me falam que já passaram por isso,ou que conhecem alguém que passou, mostra um perfil muito diferente. Eles muitas vezes têm família,às vezes têm filhos, amigos, etc.

Eu acredito que somente através da informação e da educação das nossas crianças e da conscientização da sociedade conseguiremos evitar que mais casos aconteçam.

7 - O maior entrave talvez seja os pais conseguirem falar sobre o assunto (e sobre sexo em geral) com seus filhos. Quais as dicas que você dá para eles? Como aborda o tema com sua filha? Como fazia antes de escrever o livro?

Eu penso que quanto mais informação nós tivermos sobre esse assunto,mais preparados estaremos para combatê-lo. Não adianta virar a cara, não adianta fugir do assunto, não adianta fazer de conta que não ocorre. É doloroso, mas precisamos ter coragem para ver o que tem que ser visto, ouvir o que tem que ser ouvido e depois usarmos o bom-senso e agirmos a respeito.

A dica que dou para os pais é que busquem cada vez mais entender o assunto para que possam contribuir nessa luta. Conversem com os vizinhos, com os amigos, com os colegas, com o chefe, com todo mundo – longe dos ouvidos das crianças,para não assustá-las. Recomendo o filme “O Lenhador” para os interessados em entender as emoções conflitantes decorrentes de um abuso.

Embora eu tivesse muita urgência em alertar a minha filha, não me atrevi a abordar o assunto com ela antes do livro porque não encontrava uma maneira adequada. Criei, inclusive, o Jogo das Perguntas que se encontra no final do livro. Lá coloco 5 perguntinhas que as crianças podem responder e que vão demonstrar se ela realmente entendeu a mensagem de como evitar ou sair de uma situação de abuso.

8 - No livro, você usa o conhecimento prévio das crianças sobre sexo para abordar o tema. Até que ponto esse conhecimento pode ser saudável?

O livro está indicado para crianças de 5 anos ou mais. Uma das perguntas do Jogo das Perguntas é: “Dê exemplo de brincadeira de adulto”. As crianças de 5 anos geralmente repetem o exemplo que cito no livro, o beijo na boca. Algumas  cianças de 9 anos já respondem “Sexo” diretamente. Então, é importante que não forneçamosões para elas, e sim que trabalhemos com o repertório que cada faixa etária tem. Daí a importância desse tema ser trabalhado dentro da sala de aula.

9 - Até então, a questão está focada na família. Qual o papel da escola nessa questão? Ela deve orientar as crianças?

É essencial que esse tema seja abordado nas escolas e que os professores sejam capacitados adequadamente. Especialistas avaliam que, a partir dos 5 anos, já é possível orientar a criança sobre a abordagem sexual imprópria por parte de adultos. Estudos em diversos países mostram que a escola tem um papel fundamental nesse contexto. Eles apontam que a escola mostra-se como situação ideal para detecção e intervenção junto aos casos de abuso sexual, justamente pelo tempo considerável em que a instituição, a criança e seus familiares interagem. É imprescindível colocar o tema abuso sexual infantil dentro das salas de aula, nos anos iniciais do Ensino Fundamental (que compreendem do 1° o 5° ano, sendo que a criança ingressa aos 6 anos de idade).  Ou fazemos isso ou os abusadores continuarão chegando primeiro.

10 - Políticas públicas podem ajudar? Como?

A capacitação dos professores para trabalhar essa temática é muito importante. A conscientização da população sobre as conseqüências a curto e longo prazos decorrentes do abuso também são importantes. A disponibilização de serviços de apoio psicológico aos adultos que se declarem vítimas de abuso é importante.
Avançamos bastante com as políticas públicas já implementadas mas ainda há muito a fazer.

"A responsabilidade é nossa" (Gazeta On-Line 16/04/2011)

Vítima de abuso sexual na infância, a administradora Odívia Barros se tornou escritora de livros infantis para proteger a filha, de cinco anos, de possíveis investidas de outros pedófilos. Em Segredo Segredíssimo, a história curta e os desenhos cheios de significados mostram às crianças verdades difíceis para maioria dos pais abordar: a de que os pedófilos podem estar em qualquer lugar - até mesmo dentro de casa - e de que é preciso denunciar quando alguém quer "fazer brincadeira de adulto". "É difícil falar sobre o assunto sem assustar as crianças. Queria um livro que me ajudasse a abordar isso. Como ele não existia, resolvi escrever um", conta Odívia.

Leia o primeiro capítulo de Segredo, Segredíssimo

Como proteger seu filho


Por que escrever um livro sobre abuso para crianças?
O livro é sobre como evitar ou sair de uma situação de abuso. Eu sofri abuso sexual na infância e tinha uma grande preocupação em proteger a minha filha para que ela não passasse por isso. Mas como falar de um assunto tão difícil com uma criança de apenas 5 anos? Não sabia se ela iria entender o que eu estava tentando ensinar. E nem o que eu poderia dizer à minha filha tão pequena que a ajudasse caso ela vivenciasse uma abordagem de um abusador. Todas essas dúvidas me angustiavam. Comecei a estudar o papel dos contos, das histórias e dos mitos. Foi assim que aprendi que as histórias são bálsamos medicinais. Elas revelam sábias instruções a respeito da vida e têm uma força incrível! Num conto de fadas, por exemplo, os processos interiores são exteriorizados e se tornam mais compreensíveis pela forma como são representados pelas personagens e acontecimentos da história.

Gostaria que você falasse mais da sua experiência pessoal...
Infelizmente, não tive uma orientação adequada sobre o assunto. Meus pais sempre foram muito cuidadosos e me ensinaram o que nós, adultos, costumamos ensinar aos nossos filhos: não falar com estranhos, por exemplo. Mas como podemos esperar que uma criança se defenda de algo que fingimos não existir? Como uma criança pequena pode imaginar que uma pessoa da família ou um amigo que frequenta sua casa vai fazer mal a ela? É responsabilidade dos adultos proteger as crianças. É responsabilidade dos adultos mostrar que o perigo existe e que é possível se defender revelando o ocorrido. E quanto mais cedo a criança reconhece e revela o perigo, mais tempo temos de agir e impedir que ela passe por uma situação que vai marcá-la pelo resto da vida. Comigo aconteceu como acontece em 90% dos casos: envolvendo familiares.

Como os pais podem fazer esse alerta sem assustar?
Não queria que minha filha ficasse com medo dos adultos em geral e dos parentes e amigos em particular. Por isso acredito que a literatura adequada é uma grande arma. Quando ouvimos uma história, de certa forma vivenciamos a experiência. Sofremos quando a heroína se defronta com os perigos e ficamos felizes quando ela consegue achar uma saída. Para a criança, será apenas mais uma história entre tantas que elas conhecem. Mas se algum dia elas precisarem, já terão o conhecimento necessário para evitar ou sair de uma situação de abuso. É claro que o fato de a criança ter esse conhecimento não garante que ela vá usá-lo, mas ela vai ter essa chance. E há quatro passos básicos que uma criança deve estar pronta para dar.

Quais são?
Primeiro, é preciso reconhecer a aproximação inapropriada do adulto. Depois, resistir a induções, ou seja, aprender a dizer "não". Em terceiro, reagir rapidamente para sair da situação. E, por último, contar para alguém sobre o ocorrido. E são os pais que devem dizer ás crianças que isso precisa ser feito. No livro, tudo é apresentado de uma forma lúdica, adequada para o mundo infantil.

Por que é tão difícil para a vítima denunciar o abuso?
Porque ninguém avisa à criança que isso pode acontecer. Ela não se sente à vontade para compartilhar o ocorrido com um adulto. No livro eu mostro, pela reação da mãe da personagem abusada, que a criança deve ser acolhida e acalentada ao revelar o segredo, e não repreendida. Se a criança aprende que será compreendida e confortada, ela se sente mais à vontade para relatar qualquer tentativa de abuso. Do jeito que fazemos até agora, sem falar sobre isso, ela fica ainda mais temerosa por não saber qual será a nossa reação. Ela não revela o segredo por medo da perda do amor, da perda da consideração e do carinho da família. E o abusador a faz acreditar nisso. Por isso é tão importante que as crianças saibam, desde cedo, que serão protegidas e não repreendidas ou condenadas.

Como identificar um possível abusador?
Do jeito que tratamos, parece que os pedófilos são seres diferentes, mas eles podem ser qualquer pessoa. Essa mitificação só favorece os abusadores. Eles têm família, amigos, trabalho... Enfim, são pessoas tão "normais" quanto qualquer um de nós. Um pedófilo não precisa sentir atração só por crianças. Entender isso é importante para evitar mais casos.

No livro, você usa o conhecimento prévio das crianças sobre sexo para abordar o tema. Como saber até que ponto ir?
O livro está indicado para crianças de 5 anos ou mais. Criei o Jogo das Perguntas, com cinco perguntinhas que mostram o que a criança entendeu. Uma das perguntas é: "Dê exemplo de brincadeira de adulto". As crianças de 5 anos geralmente repetem o exemplo que cito no livro, o beijo na boca. Algumas crianças de 9 anos já respondem "sexo" diretamente. Então, é importante que não forneçamos informações para elas, e sim que trabalhemos com o repertório que cada faixa etária tem. Daí a importância desse tema ser trabalhado dentro da sala de aula.

Qual o papel da escola nessa questão?
É essencial que esse tema seja abordado nas escolas e que os professores sejam capacitados. Especialistas avaliam que, a partir dos 5 anos, já é possível orientar a criança sobre a abordagem sexual imprópria por parte de adultos. A escola é o local ideal para detectar o abuso, pelo tempo que as crianças passam lá, interagindo. É imprescindível colocar o tema dentro das salas de aula, nos anos iniciais do ensino fundamental. Ou fazemos isso ou os abusadores continuarão chegando primeiro.

Como as políticas públicas podem ajudar?
A conscientização da população sobre as consequências a curto e longo prazos decorrentes do abuso é importante. Assim como disponibilizar serviços de apoio psicológico aos adultos que se declarem vítimas de abuso. Avançamos bastante, mas ainda há muito a fazer.


Perfil

História - Odívia Barros nasceu em Santaluz, interior da Bahia, em 1977. Sofreu abuso sexual na infância e a partir da necessidade de orientar a sua filha pequena, com 5 anos na época, decidiu escrever um livro infantil que orientasse as crianças a evitar ou sair de uma situação de abuso.

Atuação - Usa as redes sociais para conscientizar a sociedade sobre o grave problema do abuso sexual e da pedofilia. Dá palestras em escolas e empresas sobre o uso da literatura no combate ao abuso sexual infantil. Dá treinamento para educadores e outros profissionais interessados no tema. É formada em Administração e atualmente faz Formação Profissional em Terapia Holística Transpessoal no Grupo Ômega em Salvador.

Livro - Segredo Segredíssimo, publicado pela Geração Editorial, é o primeiro título infantil a abordar a questão da pedofilia no Brasil. Ilustrado por Thais Linhares, o volume combina texto e imagens direcionados às crianças de forma leve, mas com seriedade.

Vítima de abuso sexual diz que tema deveria ser abordado nas escolas (Educacion no Sexista)

Odívia Barros, de 33 anos, é autora do livro 'Segredo Segredíssimo.'
História de abuso sexual na infância foi vivida pela escritora. Assim como a menina Adriana, personagem do livro "Segredo Segredíssimo", sua criadora, a autora Odívia Barros, de 33 anos, sofreu abuso sexual na infância.

Fonte: Globo.com
Vanessa Fajardo Do G1, em São Paulo
A obra, lançada neste mês, é destinada a crianças e conta a história de uma menina triste e medrosa que tinha um segredo: era abusada por um "tio". Para Odívia, é essencial que o tema seja abordados nas escolas, logo nos anos iniciais do ensino fundamental. Especialistas na área de políticas públicas na infância e adolescência defendem que o tema precisa ser discutido no ambiente escolar, mas requer uma formação dos educadores.

A escritora argumenta que especialistas avaliam que a partir dos 5 anos já é possível orientar as crianças sobre a abordagem sexual imprópria por parte dos adultos. "Eles apontam que, após o convívio familiar, a escola mostra-se como situação ideal para detecção e intervenção junto aos casos de abuso sexual, justamente pelo tempo considerável em que a instituição, a criança e seus familiares interagem. É imprescindível discutir o tema. Ou fazemos isso ou os abusadores continuarão chegando primeiro."

A obra mostra a dificuldade que as vítimas têm de denunciar a situação. Na história, Adriana só contou sobre o abuso à mãe porque foi incentivada pela amiga Alice.

Odívia foi motivada a escrever o livro, pois queria evitar que a filha, de 5 anos, passasse pela mesma situação. "Mas como falar de um assunto tão difícil com uma criança? Pensei que deveria existir um livro que orientasse sobre o tema, sem assustá-las. Então resolvi escrevê-lo. Esse é o meu livro de estréia. Outros virão."

Para ela, a escola tem o compromisso ético e legal de notificar às autoridades casos suspeitos ou confirmados de maus-tratos, que incluem a violência sexual. "O ambiente escolar é um excelente lugar para que as discussões sobre abuso sexual aconteçam, sempre respeitando a faixa etária e o nível de conhecimento da criança."


Na opinião de especialistas ouvidos pelo G1, o falar de abuso sexual na escola requer, sobretudo, uma formação especializada dos educadores.

"É necessário adequar a discussão para as pessoas que podem contribuir. Refletir com formadores de opinião, professores e educadores. A escola é um espaço apropriado, mas é necessário tratar com ressalva o público infantil", diz a socióloga Graça Gadelha.

Para Graça, publicações como "Segredo Segredíssimo" necessitam de orientação e diálogo porque a "criança não tem capacidade de refletir e entender a mensagem."

Itamar Gonçalves, coordenador de programa da Childhood Brasil, concorda que tais livros exigem "mediação." "É um material adequado, mas exige orientação de um adulto, da família ou da escola. Hoje não dá mais para a escola ficar ausente desta conversa. A comunidade escolar tem papel fundamental na prevenção, identificação, bem como na notificação dos casos de violência sexual."
Para Gonçalves, o tema sexo ainda é tabu na sociedade, muitas vezes os educadores são conservadores. Porém, segundo ele, é necessário discutir questões como desejo e afetividade, que vão muito além do conceito do início da década de 90 que tratava o sexo apenas como reprodução.

A Chidlhood Brasil, organização que defende os direitos das crianças e adolescentes contra abuso e explora sexual, possui um projeto de formação de educadores que já foi levado para os municípios de São Paulo e do Grande ABC. Atualmente, o trabalho é desenvolvido em nove cidades pernambucanas. O objeto é capacitar os educadores para que saibam prevenir, identificar e notificar os casos de violência sexual.

O Ministério da Educação também realizou um projeto de formação de 500 profissionais, sendo 430 da educação e 70 da rede de proteção de direitos de crianças e adolescentes, entre eles, conselheiros tutelares, profissionais de saúde e do desenvolvimento social. Além disso, o MEC possui três publicações que contemplam o tema destinadas aos educadores. São elas: "Guia Escolar: Métodos para Identificação de Sinais de Abuso e  Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes",  "Escola que Protege" e "Impactos da Violência nas Escolas".